COMO LIDAR COM O LUTO

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Frente ao sofrimento de uma pessoa enlutada, normalmente sentimos grande angústia e pesar, não é mesmo? Ficamos sem saber como agir, o que dizer e como ajudar aquele que sofre. Quando somos nós os enlutados, da mesma forma faltam-nos ações e palavras para preencher com significado o vazio que sentimos. O fato é que, apesar da dor, precisamos encontrar meios de enfrentar o sofrimento e seguir vivendo. Então nos perguntarmos: Como superar o luto? Queremos encontrar formas de amenizar a tristeza e recuperar a alegria de viver.

Na experiência de vivenciar uma perda, o apoio de amigos e familiares é fundamental. Todavia, apesar das boas intenções, algumas pessoas, ao se depararem com o sofrimento do outro, acabam tendo comportamentos, falas ou posturas que prejudicam ainda mais o enlutado. Pensando nisso, resolvi trazer algumas orientações para esse momento tão delicado de nossas vidas. Vamos a elas:Terapia do Luto Online

 

JAMAIS TENTE SILENCIAR A EXPRESSÃO DE PESAR E LUTO

Às vezes, por não aguentarmos ver a dor do outro, tentamos silenciá-la: “Seja forte”; “Ele não ia querer ver você chorando”; “Você precisa ficar bem pela sua família”; “Foi melhor assim”… Neste momento a pessoa não quer, não consegue e nem precisa ser forte! E diante de frases assim, pode se sentir ainda mais angustiada, uma vez que entende que seu comportamento é errado e que deveria se esforçar mais para não estar tão abalada. Entretanto, o luto deve ser vivido e expressado para poder ser elaborado. E, mesmo nos sendo difícil ver o sofrimento do outro, precisamos acolhê-lo. O melhor caminho ainda é oferecer nosso apoio e estarmos dispostos a escutar. Não há conselhos fáceis, nem receitas prontas. Mais do que palavras, é preciso mostrar-se disponível e presente enquanto o enlutado mergulha na sua dor.

RESPEITE E ACOLHA AS REAÇÕES DE DOR DO ENLUTADO

O luto tende a despertar emoções e comportamentos extremos e cada pessoa reage a ele de uma maneira muito singular. Algumas pessoas podem chorar compulsivamente enquanto outras reagem de forma oposta, mostrando-se frias e indiferentes ou ocupando sua mente com trabalho ou com providências práticas a serem tomadas. Não significa que essas pessoas não estejam sofrendo ou que sofrem menos. Muitas vezes esse comportamento surge (de forma inconsciente) justamente por que a dor é imensa e por isso a pessoa evita entrar em contato com ela. Normalmente quando o enlutado reage de maneira diferente do que é esperado, é taxado e criticado por uma sociedade que tenta encaixar todos em um determinado padrão.  O certo é que não há um manual de instruções sobre como viver o luto ou quais reações se deve ter. Cada um manifestará o pesar à sua maneira, mas todos merecem ser respeitados e apoiados em seu sofrimento.

PERMITA-SE TER E EXPRESSAR SENTIMENTOS MENOS “NOBRES”, COMO RAIVA, REVOLTA E CULPA

Tão comuns e dignos quanto os sentimentos de tristeza e pesar são os sentimentos de raiva, revolta e culpa. Sim, é permitido e às vezes até mesmo necessário sentir ódio e raiva daquele que partiu. Temos o direito de sentir raiva ao pensar que fomos abandonados, querer explicações e nos sentir injustiçados. É comum também sentir raiva de si mesmo por ter sobrevivido, raiva do morto por não ter procurado ajuda, raiva dos médicos etc. Podemos também nos sentir culpados pela morte do ente querido. Quem, em um momento de raiva, já não desejou que o outro desaparecesse?  Todos esses sentimentos são válidos e estão presentes em quem vive o luto, principalmente no início da perda. Todavia, por seu aspecto mais hostil, costumam ser considerados errados e irracionais e o enlutado tenta negá-los. Sufocar tais sentimentos pode resultar na complicação do luto e/ou no surgimento de doenças físicas e psicológicas. Por isso, aceitar seus sentimentos e se permitir expressá-los é essencial para o bom andamento do processo de luto.

OUÇA COM ATENÇÃO QUANDO O ENLUTADO FALA SOBRE O ENTE QUERIDO QUE PERDEU

Perder uma pessoa querida é algo muito impactante e que precisa ser assimilado aos poucos. Por isso, um comportamento muito comum após uma perda é a constante ruminação e questionamento acerca das circunstâncias e demais eventos ligados ao momento da morte.  Da mesma forma, é também comum a pessoa enlutada relembrar histórias, gostos e momentos vividos ao lado daquele que partiu. Por mais que às vezes isso possa ser doloroso, por mais que nossa vontade seja de “distrair” o enlutado dessas lembranças, essa é uma fase importante do trabalho de luto e precisa ser vivida. É a partir disso que o enlutado passa a ter maior consciência de sua perda e a percebê-la como real e irreversível. É também pela verbalização de suas histórias e memórias que o enlutado compreenderá que o vínculo com o falecido continuará a existir, apesar da ausência física, e isto lhe dará maior serenidade para então retomar a sua vida.

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NÃO TENTE CALAR A DOR DA PERDA COM REMÉDIOS

Ana Cláudia Quintana Arantes, famosa médica especialista em cuidados paliativos, é incisiva ao afirmar que a única forma de se “curar” da dor é ir fundo nela, vivê-la intensamente. Segundo a médica, o luto é um processo natural e a dor não deve ser evitada ou medicalizada. Quando se “protege” alguém de viver sua perda por meio de calmantes, antidepressivos ou ansiolíticos, estamos na verdade “produzindo um ser incapaz, impotente, por que é da vontade de superar a perda que vem a potência de cada um” (Viviane Mosé – Psicanalista). O uso de medicação é indicado apenas em casos específicos, quando o luto traz limitações consideráveis à vida do enlutado ou quando há a presença de transtornos de ansiedade ou depressão. Na grande maioria dos casos, para aqueles que não conseguem elaborar uma perda, o melhor tratamento ainda é a psicoterapia. Enquanto o medicamento apenas abafa a dor, na psicoterapia a dor surge, é acolhida e ressignificada. Deste processo resulta um ser mais consciente, com maior controle de sua vida e pronto para retomar seu cotidiano interrompido pela perda.

E AGORA, O QUE FAZER COM OS PERTENCES DO FALECIDO?

Esse é um questionamento frequente e cuja resposta não pode ser simplista. Enquanto algumas pessoas buscam se livrar imediatamente de tudo que invoque a lembrança do morto, outras sentem que manter seus pertences por perto seja uma forma de assegurar sua presença. O fato é que não há como dizer qual a melhor ação a se tomar. O luto é um processo muito particular, da mesma forma essa decisão também deve ser. Quem deve decidir o melhor momento para destinar os pertences do ente querido é o próprio enlutado. Algumas pessoas acabam decidindo isso por ele, e acreditam estar lhe fazendo um bem quando levam embora tudo o que traz a recordação do morto. Todavia, olhar para esses objetos, tocá-los, sentir o cheiro, chorar, é muito importante uma vez que auxilia o enlutado a assimilar a perda como algo real, concreto e irreversível. Com o passar do tempo a pessoa enlutada vai retomando sua vida, seus afazeres e em dado momento, sentirá que é a hora de destinar os objetos do ente querido e seguir vivendo. É um processo que acontece naturalmente conforme a progressão do trabalho de luto.

LEVE A CRIANÇA A FUNERAIS E DEIXE-A PARTICIPAR DOS RITUAIS DE DESPEDIDA 

Muitas vezes, para “poupar” a criança do sofrimento, os adultos evitam levá-la a velórios ou rituais de despedidas. No entanto, a criança, mesmo ainda muito pequena, é capaz de perceber quase tudo o que acontece a sua volta, ainda que não expresse em palavras. Percebe a tristeza e a ansiedade dos pais (mesmo quando estes tentam disfarçar) e tenta encontrar respostas. Quando essas lhe são negadas, aumenta ainda mais sua curiosidade e fantasias em torno do que aconteceu. Obviamente não é preciso, nem recomendável, expor a criança a situações extremas, cuja complexidade ela ainda não é capaz de compreender. Mas, caso ela deseje acompanhar os rituais de despedida, é importante que lhe seja explicado o que está acontecendo. Que ela seja informada, de forma sincera e objetiva, sobre o que vai encontrar no local do velório, como vão estar as pessoas e por quê. À criança deve ser dado o direito de também viver seu luto, à sua maneira e junto de sua família.

E AINDA SOBRE A CRIANÇA: EVITE LHE DIZER QUE A PESSOA QUE MORREU VIROU ESTRELINHA NO CÉU

Ainda que esta seja uma explicação comum dada a nossos pequenos, não é a melhor maneira de lhes falar sobre a morte de uma pessoa querida. Dizer, por exemplo, que o vovô virou uma estrelinha no céu, pode confundir a criança e fazer surgir perguntas inusitadas como: “E onde o vovô está quando é dia e não tem estrelas?”. Na literatura sobre o tema, há relatos acerca de crianças que, por acharem o céu lindo, consciente ou inconscientemente tentaram se ferir, encontrar uma forma de morrer para então ir ficar junto com o vovô e as outras estrelinhas. Cabe lembrar que a criança tem conceitos e imagens, muito diferente dos adultos, sobre o que é a morte e o morrer, e isso deve sempre ser levado em consideração. Dessa forma, o ideal mesmo é ser o mais honesto possível ao falar com a criança sobre a morte. Dizer que a pessoa morreu, que não vai mais voltar e que hoje ainda não se sabe para onde vamos depois que morremos. Tudo bem, isso pode até ser um pouco frustrante, mas pelo menos não estaremos mentindo para ela e, frustração também precisa ser experimentada. Neste artigo https://www.psicologaadrianaklein.com.br/luto-infantil-dicas-praticas-para-ajudar-nossos-pequenos-a-lidar-com-a-morte/ falo especificamente sobre o luto infantil e aprofundo o tema.

PERMITA-SE VOLTAR A SORRIR

Com o passar do tempo a dor da perda tende a diminuir e os sentimentos de luto e pesar começam a dar espaço a lampejos de alegria. Aos poucos a pessoa volta a fazer planos, retoma suas atividades e o convívio com amigos e familiares. Nesta etapa, é comum que aflore um sentimento de culpa. Muitas pessoas tem o pensamento errôneo de que ao se alegrar ou aceitar convites para festas ou viagens estarão minimizando sua perda ou traindo a memória do morto. Mas, assim como a tristeza, a alegria também faz parte da vida e precisa aos poucos retomar seu lugar. Momentos de tristeza e choro certamente continuarão a existir, mas será muito melhor, e mais saudável, se aos poucos puderem ir dividindo espaço com a felicidade e a vontade de viver.

Em uma experiência tão intensa e confusa como é o luto, saber como ajudar, saber como se acalmar, saber mais sobre o tema pode fazer toda a diferença. Sabendo disso, ofereço a pais, familiares e enlutados em geral sessões de orientação/psicoeducação em luto. São sessões em que tiro dúvidas, explico como se dá o processo de luto, o que é “normal” e esperado diante de perda, o que precisa de atenção e cuidado, como se organizar após a perda etc. Então, se você se sente perdido e está precisando entender melhor o seu momento de luto ou o luto de algum familiar ou amigo, entre em contato. Posso te ajudar a tornar esse momento um pouco mais leve.

6 COMENTÁRIOS

  1. Olá! Adriana!

    Muito bom! Acabei por fazer uma verdadeira imersão no texto, tal qual foi a minha identificação com o conteúdo, já que passei algumas vezes pela experiência do luto, em especial, com a morte do pai e da mãe. Realmente, a morte chega para todos, pois ela e a vida andam lado a lado!!!!!

    Abraços!

    • Olá, José!
      Que bom que você gostou! Obrigada. Sim, apesar de todos fugirmos dela, acredito que é a certeza da morte que torna a vida tão especial. Saber que nada dura para sempre deveria ser motivação suficiente para querermos aproveitar tudo o que a vida tem a nos oferecer. Viver intensamente e em plenitude. Imagino que quem já vivenciou a morte tão de perto, como você relata, sabe muito bem o que isso significa…

      Grande abraço!

  2. Boa tarde Drª Adriana,
    Hoje fazem exatamente cinco meses que perdi meu filho….um filho bom, amigo….cheio de qualidades e defeitos como todos nós. Mas meu filo, tão amado, tão jovem. Com apenas 38 anos enfartou e foi fulminante.
    Desde então eu tb parei de viver, não tenho mais motivaçao. Ele era tudo na minha vida. Minha referência. Dediquei minha vida a ele e hoje faço o que?
    Já me falaram tanta coisa que meu unico pensamento hoje é abreviar meus dias aqui.
    Estou no fundo do poço, se é que tem fundo. Ficamos vagando sem entender nada do que aconteceu e porque? Porque um ser saudável, cheio de vida, com dois filhos pra criar é arrancado da minha via sem nem pedirem licença? Estou perdida e extremamente desanimada.
    Me ajude se puder.
    Ficarei eternamente grata.
    Uma mãe perdida, louca pra encontrar seu filho.
    Rose

    • Oi Rosmari! Sinto muitíssimo por sua perda. Gostaria, do fundo do meu coração, de ter palavras poderosas o suficiente para levar essa tua dor embora… O que eu preciso te dizer é: Não carregue toda essa dor sozinha. Divida com alguém. Busque um familiar ou um amigo de tua confiança e converse com essa pessoa. Fale do teu filho, das boas lembranças que tens dele, da história que vocês compartilharam. Tenha certeza que, mesmo que teu filho não esteja mais contigo, essas histórias e tudo o que vocês viveram juntos, não morrerá jamais. Falar, conversar com alguém sobre tua dor é muito importante agora. Procure uma psicóloga na tua cidade e compartilhe isso tudo. Talvez agora seja difícil acreditar que isso possa passar, talvez tudo pareça escuro e sem saída, mas dias melhores virão, tenho certeza. Tente sobreviver cada dia, mais um dia.
      Onde você mora, Rosmari? Quem sabe eu possa te indicar algumas pessoas ou instituições onde você pode conseguir ajuda…

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