O mês de setembro é mundialmente conhecido como o mês de prevenção ao suicídio. E trabalhar na prevenção do suicídio é mesmo fundamental. Todavia, em paralelo à prevenção, é essencial cuidar também daqueles que tão bruscamente perdem seu ente querido dessa maneira. E quase todos nós entramos nessa lista. É muito provável que você também já tenha perdido alguém por esse tipo de morte ou que conheça alguém que perdeu. Infelizmente, o suicídio está cada vez mais presente em nosso meio.
Segundo diversos pesquisadores do tema, perder uma pessoa querida por suicídio é um evento tão traumático que pode ser comparado a vivenciar uma catástrofe ou um acidente de grandes proporções. Por isso mesmo, os familiares e amigos que são diretamente impactados por uma morte dessa natureza são chamados de sobreviventes. É sobre os sobreviventes que quero falar hoje.
Quando alguém que nos é próximo morre por suicídio três questionamentos principais costumam surgir: “Por que ele fez isso?”; “Por que eu não preveni isso?”; “Como ele pôde fazer isso comigo?”. Perguntamos… Buscamos por uma resposta que dê algum sentido, que nos ajude a encontrar um pouco de lógica em uma situação que é totalmente desconcertante. Sobreviver a um suicídio é doloroso, é confuso, faz perder o chão. E, não bastasse toda a dor que uma morte sempre causa, na morte autoprovocada outros sentimentos também costumam aparecer: vergonha, culpa, raiva, medo e alívio são os principais.
Por todo o preconceito e estigma que ainda existe em torno do suicídio, quando se perde um ente querido dessa forma sentimentos de vergonha costumam ser muito comuns. Sentimentos estes algumas vezes reforçados por olhares e comportamentos da sociedade: “Aquela ali é a mãe daquele que se matou”. E a pobre mãe, além de lidar com toda a sua dor, ainda precisa enfrentar a “condenação” social. Ou até mesmo tentar explicar uma morte que para ela também foge à compreensão.
A culpa é outra companheira silenciosa dos sobreviventes. “E se eu tivesse feito tal coisa?”; “Como eu não percebi quando ele falou que…”. Sempre acreditamos que deveríamos ter feito mais e bem facilmente nos esquecemos do quanto já fizemos! Fato é que, por mais que gostaríamos, não temos controle sobre os pensamentos e atos de outra pessoa. E, certamente, ninguém se mata por que você fez ou deixou de fazer tal coisa. No suicídio nunca é simples assim. Quem recorre a ele, na grande maioria das vezes, já está há bastante tempo em sofrimento psíquico. São pequenas e grandes frustrações, angústias, problemas e dificuldades que vão se acumulando, às vezes por muitos anos. Quando a pessoa chega ao ponto de ver no suicídio a única saída para a sua dor é porque ela já passou muito tempo suportando, lutando, tentando ser forte. Não foi porque você fez ou deixou de fazer alguma coisa. Carregar culpas infundadas pode dificultar a elaboração do luto e até mesmo levar ao adoecimento físico. Não faça isso.
O suicídio de alguém querido é um golpe duro à nossa autoestima. “Ele se matou, não pensou em mim.”. Em outras palavras: “Não fui importante o suficiente para fazê-lo ficar vivo”. Sentimo-nos diminuídos, nosso senso de valor pessoal é afetado. “Como ele pôde fazer isso comigo”. E, então, sentimos raiva. Raiva pela pessoa não ter tentado mais um pouco, raiva por ela não ter pensado naqueles que ficaram, raiva por ela não ter pensado em nós. Tudo bem, não tem problema nenhum em sentir raiva. É normal. Talvez o problema maior esteja em não expressar essa raiva, em guardá-la dentro da gente. Ali sim ela pode fazer grandes estragos. Expressar a raiva de forma saudável é muito útil. Se precisar de ajuda com isso, procure um psicólogo.
Também é comum que filhos que perdem pais por suicídio sintam medo de um dia ter o mesmo fim. “Se eu chegar a esse ponto de sofrimento, será que também tentarei tirar minha vida?”. O medo de não ter controle sobre si mesmo, o medo de seus próprios impulsos destrutivos assustam e trazem consigo uma sensação de destino ou fatalidade. Em meio à dor esses pensamentos costumam surgir e dificilmente se tem controle sobre eles.Contudo, não devemos esquecer nunca que temos controle sobre nossa vida, que podemos controlar nossos atos e que podemos pedir ajuda quando acreditamos que não podemos mais.
Talvez pareça estranho em um artigo sobre suicídio falar em alívio. Mas, esse também é um elemento que pode afetar os sobreviventes. Muitas famílias que perdem um membro por suicídio já vêm bastante desgastadas, já presenciaram tentativas, já se preocuparam e renderam muitos esforços para tentar dissuadi-lo da ideia. Então, quando efetivamente acontece, certo alívio é comum. Afinal, o que tanto temiam aconteceu e agora toda essa sobrecarga de preocupações não existirá mais. Isso pode ser muito desconcertante para quem fica. Como é possível sentir alívio se seu ente querido acabou de morrer? É possível sim, e não há nada de errado nisso.
Assim como os demais, o alívio e todos esses sentimentos ambivalentes também fazem parte do enlutamento por suicídio. Devemos aprender a aceitá-los, devemos nos permitir experimentá-los livremente, sem autocríticas. Assim, eles perdem a intensidade e já não nos dominam mais. E claro, é fundamental que cuidemos uns dos outros, afinal, não sabemos das dores que o outro carrega consigo. Sejamos cuidadosos e solidários sempre.
Muito bom. De fato, precisamos cuidar mais dos vivos. Vocês, psicólogos, têm um papel fundamental nesse processo.
Obrigada,José! Pois é, há estudos que apontam que familiares de pessoas que cometem suicídio tem de 5 a 8 vezes mais chances de virem a também cometer suicídio no futuro. Claro que não é uma sentença, mas nos faz olhar para a importância de se cuidar dessas pessoas. Cuidar dos vivos/ sobreviventes também é trabalhar na prevenção.Abração pra ti.
Dra.Adriana vc atende criança de 7 anos ?
Oi Sabrina! No momento não estou trabalhando com atendimento infantil… Atendo adolescentes e adultos apenas. Contudo, dentro da área do luto, ofereço orientações/informações para pais e adultos em geral acerca de como auxiliar crianças a lidar com perdas… Caso lhe interesse, entre em contato pelo meu whatsapp e conversamos melhor. Whatsapp número: (55) 999428136. Abraço.